Minha vida de estudante propriamente dita começou aos
nove anos de idade, quando segundo a tradição familiar, e por força das
circunstâncias, eu também deveria ir para o colégio dar inicio então à tão
sonhada vida de internato.
Digo “tão sonhada” porque morria de inveja quando meus
irmãos mais velhos comentavam entre si
as peripécias pelas quais passavam quando estavam no colégio. Minhas irmãs,
Teca e Maria I. referiam-se ao internato
com tanta graça que eu achava que deveria
ser o paraíso. Aguardava com ansiedade o momento em que eu também iria passar pelas mesmas oportunidades, movimentar mais a
minha vidinha que eu considerava pacata, na fazenda brincando sozinha,
estudando ou fazendo algumas tarefinhas.
Pobre menina sonhadora! A realidade é bem diferente... claro,
eu seria apenas mais uma entre uma centena de outras internas, e nem era a
menor de todas! Não tinha porque ficar esperando que alguém fosse ter atenção
especial comigo.
Entre as novatas como eu, duas irmãsinhas de sete e
oito anos, dividiam entre si o consolo e
mitigavam as saudades. Eu, mais uma vez sozinha, agora chorando as saudades!
Saudades da Mamãe, da família, do aconchego do lar, do sabor da comida feita com capricho no fogão à lenha...
o perfume da madeira queimando...Quando amanhecia no dormitório cheio de
meninas, chegava ouvir o cantar dos pássaros nas árvores, o galo no galinheiro
o mugir das vacas e seus bezerrinhos... era o barulho da natureza que eu nem
dava conta de que me agradava tanto...
Os primeiros dias foram inesquecíveis! Tudo novo...
nada era como na minha casa...tudo... tudo diferente! Aquele bando de meninas e
mocinhas, ninguém familiar... olhares hostis, desconfiados. Lembro-me de
procurar alguém com quem dividir meus
anseios e minhas indagações, mas parecia que todas estavam alegres e felizes,
ninguém compartilhava da minha solidão. Muito acanhada, ficava sempre num
cantinho com cara de poucos amigos, pensando como seria a minha vida ali
naquele lugar estranho... de uma coisa eu tinha certeza: eu iria estudar de
verdade, iria ocupar uma carteira, escrever no caderno, desenhar... isso me
trazia ânimo e me enchia de esperança!
Chegou o primeiro dia de aula! A ansiedade tomava conta
de mim... não sabia quem seria a professora, nem quem seriam minhas colegas.
Nessa hora o número de alunas triplicou. No pátio, as alunas reunidas, internas
e externas, todas mais ou menos da mesma idade formavam filas por série. Alguém
chegou e me perguntou:
_ Qual é a sua fila?
Respondi:
_ Não sei...
_ Você se matriculou em qual série?
_ Não sei...
_ Que série você fez o ano passado?
_ Não sei... (A pessoa deve ter pensado que eu era mais
uma doente mental que as irmãs por compaixão recebiam) Aí consegui formular uma
frase mais consistente e disse: minha mãe disse que eu posso fazer o terceiro
ano. Eu não sabia, mas essa frase provocou o meu primeiro vexame de minha vida! Fui então conduzida para a
fila do terceiro ano e junto com as outras alunas, para a sala de aula.
Iniciadas as apresentações, a professora uma senhora corpulenta, vestida de
amarelo, estranha, não tinha cara de professora, pelo menos não a cara que eu
esperava que tivesse. Eu sonhava com uma professora linda, carinhosa e que me
achasse engraçadinha...
O seu visual não me agradou como também não a recepção “calorosa”
que recebi.
Esse dia ficou assinalado na minha infância. Abalou as
minhas expectativas como também a minha vida. Deixou lembranças cruéis que
carrego até hoje do meu primeiro dia de aula no internato.
Nenhum comentário:
Postar um comentário