No internato, as
opções de diversão eram restritas às oportunidades que o próprio colégio pudesse
oferecer. Duas vezes ao ano, eram-nos proporcionados passeios fora da cidade,
de preferência em fazendas onde a meninada pudesse curtir à vontade, sem
grandes preocupações para as irmãs. Essas “preocupações” giravam em torno da
presença masculina que pudesse despertar em alguma moçoila um olhar menos
inocente, uma intenção um pouco mais avançada. (Sobre esse assunto, em outra
ocasião relatarei um fato interessante). Esses passeios eram programados com
antecedência porque nem sempre havia quem se dispusesse a oferecer refeição
para um bando de esfomeadas. É bom lembrar que qualquer comida diferente da que
era servida no colégio, aguçava o carente paladar da criançada... Qual não
seria então a reação provocada por uma comidinha da roça? Bem, enquanto o
almoço ficava pronto, podíamos passear pelos lugares permitidos, andar a
cavalo, brincar na água se houvesse oportunidade, subir em árvores e comer as
frutas apanhadas no pé, que delícia!...
Quase todas as internas tinham o pezinho na roça, éramos
filhas de fazendeiros, sabíamos de tudo sobre a vida na fazenda! Mas, havia
algumas bem urbanas que não tinham o menor traquejo com a vida rural. Monjolo
era cavalo de pau e cabaça, abóbora de madeira... Não preciso dizer o quanto
eram criticadas pelo “mico”! Nós as ruralistas estávamos em nosso ambiente... éramos
desenvoltas, conhecíamos tudo naquele ambiente!
Em um desses passeios o pomar era lindo, muitas árvores
frutíferas, laranjeiras, mangueiras, pés
de jaboticabas, de abacates, bananas, abacaxis e outras... entre as fruteiras a
que mais me chamou a atenção, foi a mangueira que estava com as frutas ainda
verdes, iniciando o processo de amadurecimento. Despertou-me a atenção
particularmente uma manga lá no alto, linda, rosada... Não tive dúvida, em dois
tempos eu estava lá em cima! Ao meu alcance a coisa mais cobiçada naquele
momento. Faltava apenas um impulso para alcança-la, ali a dois palmos da minha mão...Foi quando
impulsionando o corpo com o pé num galho mais alto... era tudo o que faltava
para alcança-la... e... isso foi também tudo para ser maior carão que passei em minha vida!
Bati com a cabeça numa caixa de marimbondos! Podem imaginar o que aconteceu? A
bicharada se viu atacada e voltou-se em perseguição ao agressor, no caso, eu. Não
sei como, mas cheguei lá em baixo. Da metade da árvore escorreguei, da outra metade, caí! Esparramei-me
no chão, coberta de marimbondos! Atacaram-me por todo corpo, principalmente na
cabeça e no rosto. Quem pode avaliar o que é ser picado por centenas de ferrões
desse agressivo inseto? Tudo bem, eu invadi o espaço deles, mas precisava uma
resposta tão hostil???
O resultado do
fato foi uma tragicomédia. Comecei a inchar. O edema cobriu-me todo o rosto. O
estojo de primeiros socorros das irmãs,
se é que tinha algum,não estava preparado para tal incidente. Vieram lá com um
tal de azul de mitileno, como próprio nome diz, um líquido azul anil que passaram
em todas as picadas, isto é, em todas as partes descobertas ou mal cobertas. Imaginem
a situação. As pálpebras, os lábios, as orelhas, o nariz, o pescoço... inchados
e azuis, parecendo uma assombração. As colegas, nem preciso dizer, quase
tiveram um ataque de tanto riso!
Entretanto, eu
garanto, o vexame não foi pior que a dor
sofrida!