Ela era
doce, meiga e carinhosa. Sempre paciente, mamãe foi a nossa alfabetizadora, nos
preparando para alcançarmos classes mais altas quando chegasse o ponto de irmos
para o colégio interno. Nossos pais faziam questão que todos tivessem uma boa
educação. Como morávamos na fazenda, a saída seria pagar internato.
A época de
assumirmos essa nova etapa da vida, era determinada pela saída dos mais velhos
do colégio, ou o egresso dos mais velhos é que dependia da idade dos mais novos
que fossem alcançando a época de irem para o internato.
Dos filhos
mais velhos aos mais novos, a didática era a mesma.
As
aulas eram ministradas em casa, sem muita rigidez de horário. Mamãe nos reunia
ao redor de uma mesa e ali ministrava as
primeiros conhecimentos - alfabetização, a caligrafia, para ficar com a
letra bonita (era prioridade para papai!), as quatro operações... A tabuada... Ah!
Essa, papai fazia questão de “tomar”! Acho que é daí a origem do meu horror
pela matemática. Morria de medo quando papai me chamava! Se errasse, levava um
cocorote na cabeça! Isso pra mim era a morte! Os meus irmãos Rubens e Quincas,
mais velhos que eu, já não se incomodavam tanto, mas às vezes a coisa ficava
feia... o bicho pegava... Alem dos cocorotes, o castigo até aprender de cor a
maldita tabuada! Para amenizar a tensão, mamãe dava um jeito e deixava-nos
merendar e em seguida voltar aos estudos. Só podia sair se cumprisse o
determinado.
Os
exercícios, principalmente os de matemática (continhas) eram passados em uma
pequena lousa verde retangular (30x20 cm), com uma argolinha na lateral onde se prendia uma tira de retalho que
servia para limpar a pedra. Para que a lousa ficasse bem limpa, usávamos
molha-la na língua. A ponta dessa tira era engomada de tanto cuspe acumulado...
Uma peça no formato de um palito de
churrasquinho de uns oito centímetros de comprimento, do mesmo material da
pedra, era o instrumento de escrita. Quando precisávamos apagar, era só passar
o trapinho... molhado.
Ler mapas,
decorar os nomes dos estados e suas respectivas
capitais, conhecer os fatos mais
relevantes da História do Brasil, fazia
parte do “currículo” doméstico. Disso eu gostava, tinha o maior prazer,
decorava com facilidade e sabia a localização dos continentes, paises suas
capitais e principais cidades.
Fazia
verdadeiras viagens pelo mundo através dos mapas! Desembarcava em Portugal e
dali partia para os países vizinhos! Visitava as cidades da Europa, a localização
das capitais, o relevo, bacias hidrográficas! Tudo isso por meio de um Atlas,
que nessa fase da minha vida proporcionou parte dos meus devaneios. Mamãe me
ajudava bastante. Ela tinha um bom conhecimento geral, gostava de ler livros e jornais que papai assinava. O jornal trazia a
notícia e nós íamos localizar no mapa o local da ocorrência.
Após esse
estudo, procurava gravar na memória, para mais tarde quando estivesse livre,
viajar mentalmente, passando pelas situações, as quais haviam sido comentadas
pela mamãe.
Um dos
trechos mais visitados por mim era a palestina cujas histórias eram contadas em
um livro intitulado História sagrada.
Nele havia alguns mapas que eu queria identificar no Atlas, mas quase sempre
sem resultado devido à diferença de escala.
Posso
atribuir à mamãe o fato de toda a minha vida ter sido uma leitora contumaz,
assim como o método de ensino da matemática aplicado pelo meu pai, em mim
produziu efeitos que nunca mais consegui corrigir.
3 comentários:
Que lindo cuidado que fez um diferença significativa, como é bom ter pais com esta visão, parabéns.
Diferença significativa faz você, para mim, ao comentar com esse carinho os meus posts! Obrigada!
"meu coração se enche de ternura"... faço dessas palavras as minhas, nossos corações se enche de ternura. "Reviver estágios de minha vida, lugares, coisas, pessoas, situações relevantes..." nos faz viajar n alinha do tempo. Quer um conselho minha amiga? Faça um livro com o título Vidas em conto.
Sobre "Desejaria ter dons poéticos para transcrever fielmente esses momentos com alma de artista!"
Eu como leitora já vejo uma alma de artista.
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