quarta-feira, 27 de junho de 2012

UMA NOVA VIDA


Aos nove anos comecei realmente a minha vida escolar em sala de aula comum. Como já disse antes, morávamos na fazenda, onde não havia escola. Minha mãe foi minha primeira professora. Ela me ensinou a ler, escrever e fazer algumas continhas, o básico, fez o que pode, como professora leiga, sem metodologia e recursos didáticos apropriados. Todos nós tivemos o mesmo início, até completarmos a idade de assumirmos sozinhos a vida em uma escola sob o regime de  internato. Adeus convivência familiar! Adeus liberdade... era o início de uma nova vida...

No ambiente escolar, como em todos em que se concentram pessoas e principalmente crianças e adolescentes, as normas são necessárias para que se estabeleçam ordem e  disciplina. Isto quando se tratam de estabelecimentos comuns  nos dias atuais. Em um regime de internato, essa exigência é triplicada. Toda rotina segue uma orientação rígida, metódica, militarista. Fila pra cá, fila pra lá, nada de conversa, obediência sempre! Até os passeios pela cidade aos domingos, eram feitos em fila...

Onde quer que  estivéssemos, no pátio em recreio, em sala de aula, ou em sala de estudo, três sinais de campainha nos alertavam que deveríamos fazer alguma coisa: ao primeiro, parar o que estivesse fazendo; ao segundo, formar a fila em silêncio absoluto; ao terceiro, seguir para a atividade própria  do horário, em fila...

A campainha era o sinal de alerta para alguma coisa conforme o horário: desde o despertar  até a última atividade  do dia, dormir. Uma rotina de deveres, obediência, submissão.   Os únicos momentos que podíamos conversar eram nos intervalos das aulas e no pátio, na hora do recreio.  No pátio, era proibido fazer rodinha, isto é, conversar em grupos. Tínhamos que brincar com bola, corda, bicicleta ou joguinhos de dama, xadrez, ludo, torre etc. sob a vigilância constante de uma ou duas irmãs (freiras). A necessidade de burlar a vigilância era imperiosa  dadas as inúmeras proibições.   Tínhamos sinais convencionados de alerta geral e outros criados pelas “panelinhas”  para quando fosse necessário a comunicação entre os seus membros.

O bom comportamento era o índice para a saída em visita à família no primeiro final de semana de cada mês.  Cada professor dentro da sala de aula ou irmã que vigiasse as internas em determinado período, recebia uma planilha com os nomes das internas onde seriam marcados sinais indicadores de bom ou mau comportamento.  Quem não obtivesse média suficiente não poderia sair. Permanecia  no colégio estudando ou ajudando na limpeza das salas e áreas comuns. As punições variavam entre a chamada de atenção (pito) da Madre Superiora, da diretora, da perda da saída no primeiro domingo, da suspensão do recreio e até expulsão para os casos gravíssimos.
Tínhamos quatro meses de férias: dezembro, janeiro, fevereiro e julho. Isto quer dizer que passávamos dois terços do ano no colégio. Que fazer para viver com disposição e alegria num ambiente intolerante e austero como o que nos era imposto? Como suportar a mesma rotina, dia após dia, com saudades de casa, da liberdade, do aconchego familiar, da fartura da fazenda, da comidinha da mamãe?!... Quanta saudade! Quantas lágrimas...

Para fugir da monotonia, a saída era criar situações divertidas cheias vivacidade em que, sem nos comprometer, aprontávamos  lances espirituosos sem jamais deixarmos pistas.

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