Aos nove anos comecei realmente a minha vida escolar em
sala de aula comum. Como já disse antes, morávamos na fazenda, onde não havia
escola. Minha mãe foi minha primeira professora. Ela me ensinou a ler, escrever
e fazer algumas continhas, o básico, fez o que pode, como professora leiga, sem
metodologia e recursos didáticos apropriados. Todos nós tivemos o mesmo início,
até completarmos a idade de assumirmos sozinhos a vida em uma escola sob o
regime de internato. Adeus convivência
familiar! Adeus liberdade... era o início de uma nova vida...
No ambiente escolar, como em todos em que se concentram
pessoas e principalmente crianças e adolescentes, as normas são necessárias para
que se estabeleçam ordem e disciplina. Isto
quando se tratam de estabelecimentos comuns
nos dias atuais. Em um regime de internato, essa exigência é triplicada.
Toda rotina segue uma orientação rígida, metódica, militarista. Fila pra cá,
fila pra lá, nada de conversa, obediência sempre! Até os passeios pela cidade
aos domingos, eram feitos em fila...
Onde quer que estivéssemos, no pátio em recreio, em sala de
aula, ou em sala de estudo, três sinais de campainha nos alertavam que
deveríamos fazer alguma coisa: ao primeiro, parar o que estivesse fazendo; ao
segundo, formar a fila em silêncio absoluto; ao terceiro, seguir para a
atividade própria do horário, em fila...
A campainha era o sinal de alerta para alguma coisa
conforme o horário: desde o despertar
até a última atividade do dia,
dormir. Uma rotina de deveres, obediência, submissão. Os únicos momentos que podíamos conversar
eram nos intervalos das aulas e no pátio, na hora do recreio. No pátio, era proibido fazer rodinha, isto é,
conversar em grupos. Tínhamos que brincar com bola, corda, bicicleta ou
joguinhos de dama, xadrez, ludo, torre etc. sob a vigilância constante de uma
ou duas irmãs (freiras). A necessidade de burlar a vigilância era
imperiosa dadas as inúmeras
proibições. Tínhamos sinais convencionados de alerta geral
e outros criados pelas “panelinhas” para
quando fosse necessário a comunicação entre os seus membros.
O bom comportamento era o índice para a saída em visita
à família no primeiro final de semana de cada mês. Cada professor dentro da sala de aula ou irmã
que vigiasse as internas em determinado período, recebia uma planilha com os
nomes das internas onde seriam marcados sinais indicadores de bom ou mau comportamento.
Quem não obtivesse média suficiente não
poderia sair. Permanecia no colégio
estudando ou ajudando na limpeza das salas e áreas comuns. As punições variavam
entre a chamada de atenção (pito) da Madre Superiora, da diretora, da perda da
saída no primeiro domingo, da suspensão do recreio e até expulsão para os casos
gravíssimos.
Tínhamos quatro meses de férias: dezembro, janeiro,
fevereiro e julho. Isto quer dizer que passávamos dois terços do ano no
colégio. Que fazer para viver com disposição e alegria num ambiente intolerante
e austero como o que nos era imposto? Como suportar a mesma rotina, dia após
dia, com saudades de casa, da liberdade, do aconchego familiar, da fartura da
fazenda, da comidinha da mamãe?!... Quanta saudade! Quantas lágrimas...
Para fugir da monotonia, a saída era criar situações
divertidas cheias vivacidade em que, sem nos comprometer, aprontávamos lances espirituosos sem jamais deixarmos
pistas.
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