Percorrendo
as minhas lembranças na década de 1950 e alguns anos anteriores, vamos
encontrar a motivação que me levou a escrever os retalhos de minhas memórias.
Situações inusitadas para os mais jovens urbanos e provavelmente motivo de saudade para
os contemporâneos rurais.
Do alpendre
da casa da fazenda podiam-se ver os currais, alguns pastos como o piquete,
parte da invernada e uma pequena área cercada onde era plantado um mandiocal, aboboreiras,
cana de açúcar e batata doce, e outros. Ah! Havia também nesse mesmo conjunto, um
pé de eucalipto bem no canto da lavourinha, lindo, enorme, que balançava,
balançava ao vento...
Logo acima,
uma pequena plantação de café que se
estendia até o terreiro e a tulha. O
terreiro era um espaço de terra batida, onde o café era despejado para começar o processo de secagem. A
armazenagem do produto era feita na tulha, à granel. A produção só era
ensacada, quando fosse comercializada. Eu adorava ver a movimentação. Ensacar,
pesar, costurar a saca, empilhar... gostava também de subir nos volumes
empilhados, quando papai não estava por perto, é claro!
Nos fundos
da casa, rodeando o quintal, havia outras divisões de pasto, todas com seus
respectivos nomes, mangueiro e pastinho,
onde eram soltos os animais da lida diária, os cavalos e éguas de serviço.
Alguns
degraus separavam a casa do curralzinho que ficava bem debaixo de algumas
janelas inclusive uma do quarto dos meus pais, de onde se viam toda a
movimentação da lida com o gado. Os currais em número de dois, eram cercados de
tábuas interligados por porteiras. Adiante, após o primeiro curral ficava o
barracão que o papai chamava de casa, onde
os bezerros passavam a noite separados de suas mães. Ao lado do barracão, uma
varanda onde se guardavam as tralhas mais pesadas da fazenda, inclusive o carro
de bois.
Todas as
tardes impreterivelmente, as vacas paridas, ou seja, as que ainda estavam
amamentando, eram recolhidas junto com os bezerrinhos em um dos currais onde
era feita a apartação, a separação das vacas de suas crias. Esse procedimento
era para que a vaca pudesse reservar o leite produzido durante a noite, para que
no dia seguinte, bem cedo, fosse ordenhada, ou seja, extraído o leite que por
direito pertencia ao bezerrinho. Este, coitadinho, ficava preso no curral,
berrando... berrando, sentindo falta da mãe ou com fome mesmo, quem sabe? A
vaca, do lado de fora, em pleno exercício do instinto maternal, mugindo, como
que externando indignada a ausência do filhote.
Bem, o
leite usurpado da vaca virava queijo, manteiga, doce, requeijão da melhor
qualidade, consumido pela família ou vendido na cidade. Essa era uma tarefa que
mamãe sozinha exercia muito bem, não só porque a produção era pequena, mas
principalmente porque era muito caprichosa, sempre com muito cuidado e higiene,
dentro dos padrões da época. Nem por isso deixavam de ser deliciosos e muito
procurados!
O queijo,
trabalhado artesanalmente, o tipo meia cura, era amarelo e liso por fora, sem
imperfeições, clarinho no interior, macio e delicioso! Ao corte, podia-se ver a
manteiga escondida nas pequenas cavas.
Durante o
processo de manufatura, havia um momento ímpar para as crianças, eu adorava! A
massa, isto é, a qualhada era colocada nas fôrmas, espremida, “espinicada,” em
seguida, mais massa e repete o processo de espremer para dar liga e o queijo
ficar uniforme. No momento em que a qualhada era “espinicada” e espremida, o
soro saia carregado de pequenas partículas de massa. Era um soro esbranquiçado e
mais espesso que aparávamos em nossas canequinhas! Era um alimento rico e muito
saboroso, um momento que esperávamos com ansiedade!
Em tempos
de temperatura mais elevada, às vezes, o queijo fresco ainda na fôrma ou aquele
de um dia, sofria alteração e aumentava de volume. Embora contrariada, mamãe
tratava de consertar o dano.
Este queijo
inchado era transformado em queijo cozido tipo mussarela. O manuseio é simples:
fatiar o queijo numa vasilha com água bem quente para cozinhar; quando a massa
estiver no ponto de modelar, pega-se uma porção, trabalha-a bastante com as
mãos para eliminar o excesso de água e começa a dar a forma desejada. Mamãe
dava o formato de cabacinha. Quando os queijos inchavam... a saída pra
aproveitar, era ter mais trabalho. Eu então adorava! Aquele queijinho de
cabacinha era uma delicia! Divertido era
comê-lo desfolhado até o final!
Hoje aos 70
anos, enquanto exercito minha memória buscando os fatos vividos enquanto
criança, recordo com saudade a vida saudável, despreocupada, tranqüila, tanto
que chegava a ser monótona, porem feliz!
2 comentários:
Hum que tempo bom, pelos poucos anos que passei na fazendo, vendo a sra. relatar assim da mesmo muita saudades de uma época tranquila, onde a vida era mais rustica, mas tambem mais autentica.
Obrigada meu sobrinho, pelo comentário, só hoje o encontrei
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