A vida
rotineira do internato traz muita comoção interior por ter que seguir um
regulamento rigoroso onde todos devem seguir as mesmas orientações os mesmos
horários rígidos, disciplina... disciplina...disciplina. Todas as atividades
eram realizadas em silêncio. Uma sineta ou campainha marcava a
movimentação que deveríamos fazer para
passar de uma a outra ação imediata. Se
estivéssemos em meio a uma tarefa, deveríamos suspende-la e irmos para a fila em silêncio.
O recreio significava liberdade. Em dois
momentos após as principais refeições, tínhamos
certa liberdade. Podíamos brincar, conversar ou jogar dama, torrinha ou
outros joguinhos de menor movimentação. A criatividade para as artimanhas é característica
da idade. Então a vigilância era acentuada sobre os grupinhos que preferiam
conversar. Isso pelo temor de que as irmãs
tinham de estarmos tramando algo inconveniente. Qualquer tipo de reclusão convida à insubordinação e
não era diferente para as internas de um colégio de freiras. Sair da rotina
imposta por um regulamento sufocante era um desejo impreterível, não se podiam
deixar passar a oportunidade...
Qualquer ato menos lícito tinha que ser
combinado de forma que não deixasse suspeitas. Por isso os grupinhos eram
fechados. Para se admitir um novo membro colocava-se em votação. Tínhamos um
acerto de fidelidade, cumplicidade, confiança e proteção entre os membros do
grupo. Uma liderava e as outras colaboravam com criatividade, astúcia e ação. O
que fosse sugerido pelo grupo, todas tinham que participar, antes, porém era
debatida e votada a proposta.
Muitas
vezes nos vimos em situações perigosas em que seríamos apanhadas se não
tivéssemos o pacto de fidelidade. O fato
de ser pega em situação de culpa era tão
comprometedor perante o grupo que não cabia autodefesa. Quem fosse pega em infração deveria sofrer
sozinha as consequências até que nos
reuníssemos para deliberar o que fazer. Nem sempre tínhamos tempo para isso,
então um simples olhar era o suficiente para o entendimento e a líder tomava
sozinha a deliberação o que seria seguida por todas. Geralmente
todas se acusavam, passavam por algum castigo, baixava a nota de comportamento
e perdíamos os passeios, as saídas de final de mês o que era raro. Afinal, as irmãs também
precisavam de um descanso nem que fosse por um final de semana.
Um dia, uma
das colegas encontrando uma largatixa resolveu
aprisiona-la. Levando-a ao grupo,
resolvemos que pregaríamos uma peça em alguém. Tinha que ser uma pessoa muito
chata, que merecesse ser “castigada” por nós, o que nos daria imenso prazer de
ver passar por uma atitude ridícula. Quem seria a vítima? O animalzinho não
poderia ficar por muito tempo preso... tínhamos que agir rápido. A ação deveria
então ser naquela noite em que todas as internas estivessem na sala de estudos,
em silêncio, cada uma cuidando de suas tarefas e a irmã tomando conta na frente assentada à
uma mesa sobre um estrado pequeno de madeira que mal dava espaço para as duas
peças. Para nossa sorte a irmã que ocupava esse lugar naquele dia era uma das
mais aporrinhadoras.
Num dado
momento a líder do grupo fez um sinal e nos levantamos todas e fomos até à mesa conversar com a irmã a
título de pedir ajuda para alguma tarefa. Nessa hora a colega abriu a caixinha
atrás da irmã e a largatixa pulou e tentando se esconder, enfiou-se no meio de
tanto pano que compõe o hábito das freiras. Sentindo-se solta, a bichinha
começou correr e se atrapalhar no meio das capas e a irmã desesperada se debatia
e pulava. A coitada teria caído do
estrado, se não estivéssemos perto para socorrê-la. Foi uma situação hilariante
e ainda tiramos onda de heroínas ao salvarmos
a inocente irmã.
Não conseguíamos parar de rir; aquele riso abafado de quem não
queria demonstrar falta de respeito. A irmã tentou naturalidade mas, a situação ficou insustentável. Abrimos às
gargalhadas.
Ao sairmos dali, fomos para a capela rezar o terço. Local exato para o
“capetinha” insuflar o mal. Bastou que uma começasse a rir para as outras a
seguissem. Ninguém mais rezava, eram só os roncos abafados dos risos presos.
Algumas meninas não puderam se conter e fizeram xixi nas calças...
Ninguém percebeu a trama... a travessura ficou
na história do internato por muito tempo. O bom é que ninguém soube de onde
saiu a tal lagartixinha!
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